O júri simulado acabou, a luz apagou, os alunos sumiram… E agora, professora Fayga?
(Parodiando o célebre poema de Drummond – “E agora, José?” –, assim começo a discorrer sobre a singular experiência do nosso primeiro júri).
Aos 26 de abril, o júri simulado de “Tópicos Especiais em Direito I” foi realizado pelos calouros da Profa. Dra. Fayga Bedê, com os alunos da manhã e, à noite, com a nossa turma. O julgamento deu-se em torno dos personagens da obra “O Enfermeiro”, de Machado de Assis. A promotoria pedia justiça pela morte do senhor Coronel Felisberto, opondo-se à defesa, a qual, com unhas e dentes, lutava fervorosamente para inocentar o Sr. Procópio Valongo da acusação de homicídio doloso, por meio das teses de legítima defesa e de lesão corporal.
Tanto os promotores quanto os advogados de defesa fizeram-se valer dos argumentos lógicos e também das falácias aprendidos no decorrer da disciplina: a promotoria utilizou-se do apelo às emoções do público (argumentum ad populum) ao falar da fragilidade da vítima, de quase 60 anos, que trazia um rosário de doenças. Ateve-se aos autos e, muitas vezes, distorceu a fala da defesa (falácia do espantalho). Por seu lado, a defesa apelou à autoridade de argumentos técnicos da área da saúde, principalmente na refutação de que o coronel Felisberto morrera asfixiado. Recorreu também a fatos históricos, além de criticar a pessoa do coronel, não se valendo de argumentos concretos, mas utilizando-se de alguns diversionismos em certas falas (ignoratio elenchi).
Por um lado, os ânimos acalorados da defesa; e, por outro, uma aparente calma da promotoria. Na verdade, de parte a parte, as únicas certezas eram a ansiedade e o nervosismo à flor da pele, já que não é todo dia que se investe de uma toga e precisa argumentar, concisa e coerentemente, para uma plateia enorme de jurados – que era, inclusive, integrada pela coordenadora do curso, Profa. Dra. Andreia Costa. Mas, apesar dos desafios, o júri transcorreu de forma organizada e objetiva, com seus participantes empenhados em defender as suas teses, a fim de alcançarem o tão almejado título de vitória.
Após a conclusão dos debates, os alunos retiraram-se do auditório para a votação do júri. Em seguida, deu-se início à temida apuração de votos. A cada “inocente” lido em alto e bom som, mais os membros da promotoria afundavam-se em suas cadeiras, e a defensoria cantava vitória certa. O silêncio era ensurdecedor, e a palavra “inocente”, anunciada consecutivas vezes, rasgava o ar e deixava aflitos os corações de quem acusara Procópio veementemente. Algum alívio vinha com um “culpado”, mas estes eram escassos demais, logo perdiam a validez, sendo engolidos por mais e mais “inocente” escrito naqueles pequenos, mas significativos votos de papel. Chegamos ao fim com uma vitória arrasadora da defesa, de 31 votos contra 6. A defesa ganhara o júri, mas os apreensivos membros da promotoria foram reconfortados pela lembrança da professora: “Às vezes, não fazemos sucesso de público, mas fazemos com a crítica”.
Por fim, vão-se as togas, mas fica a experiência do primeiro júri. Que esse momento nos sirva para lembrarmos de que, quando já estivermos formados, devemos ter o mesmo ânimo, a mesma astúcia e o mesmo zelo, seja ao defendermos nossos futuros clientes, seja ao acusarmos um réu, seja ao julgarmos com imparcialidade e sabedoria. Que os inesquecíveis personagens de Machado, cujos interesses defendemos com tanto ardor, possam perpetuar em nossa memória o desejo de virmos a ser profissionais cada vez melhores! (Que Machado não tenha se revirado no túmulo).
Mas, e agora, Professora Fayga, para onde?
Creio que a resposta para essa pergunta ainda esteja um pouco longe, mas já estamos a construí-la.
Autora: Marina Araújo da Silva – acadêmica do 1º semestre de Direito (noite)